Nesta quinta-feira, 8 de agosto, o Supremo Tribunal Federal (STF) deu início ao julgamento sobre a possibilidade de testemunhas de Jeová recusarem transfusões de sangue no Sistema Único de Saúde (SUS) e a questão de se a União deve financiar tratamentos alternativos a essas transfusões. As discussões acontecem em dois recursos principais: RE 1.212.272 e RE 979.742.
Contexto do Julgamento
O RE 1.212.272 refere-se a uma paciente testemunha de Jeová que, por motivos religiosos, se recusou a receber transfusão de sangue durante uma cirurgia de substituição de válvula aórtica na Santa Casa de Misericórdia em Maceió/AL. A cirurgia foi cancelada devido à recusa da paciente em autorizar a transfusão, mesmo após assinar um termo de consentimento que alertava sobre os riscos. A Justiça de Maceió manteve a decisão de que a cirurgia não poderia prosseguir sem a transfusão, levando a paciente a alegar que essa exigência violava sua dignidade e direito à saúde.
O RE 979.742 trata do direito de pacientes testemunhas de Jeová a procedimentos médicos sem transfusão de sangue, especialmente quando esses procedimentos não estão disponíveis em sua localidade. A União recorreu contra uma decisão que a obrigava a custear uma cirurgia de artroplastia total em outro estado para um paciente, uma vez que a alternativa sem transfusão não estava disponível no Amazonas.
Manifestações das Partes
Durante a sessão, a advogada Eliza Gomes Morais Akiyama, que representa a paciente no RE 1.212.272, argumentou que o STF tem promovido decisões que reforçam a dignidade humana e o direito dos indivíduos de tomar decisões sobre seu próprio tratamento. Ela citou decisões anteriores sobre a obrigatoriedade da vacina contra Covid-19, onde foi enfatizada a proteção da integridade física e moral dos indivíduos.
As advogadas Luciana Montenegro de Castro Cadeu e Mychelli de Oliveira Pereira Fernandez, que representam o paciente no RE 979.742, afirmaram que o Estado deve custear tratamentos médicos que respeitem as convicções religiosas dos pacientes, apontando para o exemplo do Hospital Amaral Carvalho em Jaú/SP, que já adota práticas sem transfusão de sangue sem necessidade de investimentos adicionais.
Perspectiva dos Amicus Curiae
O advogado Laércio Ninelli Filho, representando a Associação das Testemunhas Cristãs de Jeová, destacou que o julgamento não é um conflito entre religião e ciência, mas sim uma oportunidade para alinhar as necessidades religiosas com o interesse público. Ele argumentou que a recusa de transfusão de sangue não compromete o direito à vida e que existem alternativas, como o gerenciamento do sangue do paciente (PBM), que são viáveis e não oneram o Estado. No entanto, ele observou que muitos pacientes enfrentam dificuldades devido à falta de uma resposta clara sobre a legitimidade da recusa religiosa.
Próximos Passos
O STF ainda deve retomar o debate sobre essas questões, sem uma data definida para a conclusão. A decisão final pode ter implicações significativas para a forma como o SUS lida com as convicções religiosas dos pacientes e como financia tratamentos alternativos no sistema público de saúde.